Autoestradas e rede Viária
Portugal construiu uma rede viária invejável a qualquer país evoluído. A discussão se foram ou não boas opções políticas, se é ajustado à nossa realidade (sobretudo no que respeita a autoestradas e vias rápidas), é nesta altura uma discussão que já vem tarde, estéril e absolutamente castradora de pensamento futuro. Existem, estão aí, devem ser utilizadas.
O que não pode acontecer (e
infelizmente é mesmo o que está a acontecer), é que este gigantesco
investimento, com um exorbitante custo de manutenção, não seja utilizado e
rentabilizado até ao seu limite.
Há partidários da “gratuitidade” de
utilização, e acérrimos defensores do princípio do “utilizador pagador”.
Parece-me outra discussão absolutamente estéril e inútil, castradora de uma
visão clarividente, moderna e vantajosa. Ganham os partidários da segunda, por
opções políticas de arranjarem dinheiro fácil, que minimize o prejuízo público
das concessões.
De facto, não há nunca gratuitidade
de utilização, e também não é real, verdadeiro e honesto, o princípio do
utilizador-pagador porque não são só os que passam nas autoestradas que pagam
os custos: todos os outros cidadãos também pagam. E duas vezes. Contribuem diretamente,
com o dinheiro dos impostos canalizados para pagar o diferencial entre tráfego
dos contratos de concessão e o tráfego que não passa e gera indemnizações; indiretamente
porque este sistema absurdo torna toda a logística mais cara, e não há cidadão
que não utilize produtos que passaram pelo sistema logístico, além de que a
economia toda é menos eficiente. Portanto, é preciso consciência de que os dois
pensamentos estão profundamente errados.
Toda a gente já percebeu que o
nosso sistema viário é abundante mas ineficiente, e que a procura de dinheiro
fácil para manter o pesadelo das concessões, através do pagamento de portagens,
é um verdadeiro “tiro no pé”.
Na prática, que fazer para tornar
transparente e útil a rede viária? Que sugestões? Creio firmemente que o
caminho será:
·
Tornar de livre circulação, sempre, todas as estradas
do país (estradas, autoestradas e pontes).
·
Financiar a manutenção através do OGE para as estradas
nacionais, autoestradas e vias principais; e dos orçamentos municipais as
outras estradas (como já acontece).
·
Eventualmente lançar um imposto extraordinário de
circulação rodoviária, aplicado uma única vez por ano a todos os veículos,
semelhante ao IUC, mas diferido deste para facilitar o pagamento por parte dos
proprietários das viaturas. E digo todas, porque facilitaria o controlo. (O
sistema logístico geral ficará mais barato, beneficiando todos os cidadãos diretamente
no custo dos produtos, e indiretamente no estímulo à economia, portanto, todos
pagariam, mas beneficiariam, independentemente de andarem muito ou pouco nas
autoestradas).
·
Acabar com todo o aparato e respetivos custos, do
controle de pagamento nas vias pagas. (Certamente que se poupam milhões de
euros).
·
Manter e redirecionar as concessões apenas para a conservação,
renegociando completa e totalmente os contratos, estendendo-os às outras vias
nacionais, mas sempre com supervisão de um organismo público (IEP, por
exemplo).
·
Fazer um controle mais exaustivo do respeito pelo
código da estrada, utilizando as tecnologias instaladas, com coimas mais
pesadas para as prevaricações que coloquem em risco a vida (velocidade e
manobras perigosas), afetando o valor das coimas também ao sistema de
manutenção viária.
·
Aplicar às viaturas estrangeiras, todas, uma taxa de
utilização, também anual, que teriam de liquidar, com a aposição de uma vinheta
na primeira vez em cada ano em que circularem na rede viária portuguesa. A não
liquidação implicaria em qualquer controle a aquisição da vinheta, e uma coima
de 3 a 5 vezes esse valor, a liquidar na hora, sob pena de apreensão do veículo
até ao pagamento (aí ainda agravado de serviços processuais associados
(bloqueio, reboque, etc.). Semelhante ao sistema utilizado na Suíça para se
circular nas autoestradas.
Há argumentos fortes para sustentar
esta opinião:
·
Princípio do utilizador-pagador (1) Vs SCUT
(2): Na discussão pública, a maior parte dos argumentos de um lado e
outro, são substantivamente falsos. Não existe a realidade da gratuitidade (2),
nem o utilizador pagador paga sozinho (o não utilizador também paga, nos
impostos e no custo dos produtos circulantes). Deve assumir-se que tem sempre
custos, e que todos, mas todos pagam sempre. Então será melhor que esses custos
sejam transparentes, conhecidos, (não ofuscados pela polémica filosófica),
desagravados das externalidades que oneram, sobretudo nos milhões gastos no
controle de passagens (Recursos humanos e tecnologia).
· Segurança - Os percursos de médio e longo
curso são muito mais seguros se efetuados em melhores vias (autoestradas e vias
rápidas), podendo ter um impacto positivo enorme na segurança rodoviária, com
benefícios diretos para milhares de cidadãos com a redução de acidentes; para
as companhias de seguros com as indemnizações; para o sistema de saúde com a
redução de acidentados graves e ligeiros; e com um enorme impacto positivo nas
vias secundárias e regionais, porque veriam reduzido enormemente o tráfego de
longo curso que por lá passa em virtude de não poderem pagar portagens.
· Tempo/rentabilidade – A circulação de médio e longo curso generalizada por
autoestrada permitiria que os transportadores e toda a plataforma logística
nacional fosse economicamente rentabilizada, dado que entre dois pontos
(Lisboa-Porto, p.ex.), seria possível transitar com carga nos dois sentidos em
apenas um dia, quando hoje só é possível num sentido, por se utilizares
estradas “secundárias”. Além disso, o entupimento das vias locais, pelo intenso
tráfego de longo curso, lento, contínuo e de grande risco em termos de
segurança, provoca muitos milhões de horas perdidas aos portugueses, e um
enorme acréscimo de consumo de combustível, com o respetivo nefasto impacto
ambiental. A poupança de combustível, o impacto ambiental (licenças de carbono
e outros), os milhões de horas perdidos em filas, que poderiam ser utilizados
em atividade produtiva, são um rombo gigantesco na economia do país.
· Manutenção das vias – O atual sistema tem enormes agravamentos de
custos públicos de manutenção. As autoestradas, são vias com uma estrutura
muito mais sólida em termos de construção, mais resistentes ao desgaste, mais
retilineas, mais protegidas e seguras. Por via dos custos diretos associados
imputados aos utilizadores (portagens), não passa por lá o tráfego suficiente
para a sua rentabilização. Mas esse tráfego vai passar por estradas
“secundárias”, menos preparadas, menos seguras, mais sinuosas, mais frágeis,
provocando um desgaste insuportável, com custos agravados de manutenção, e
todos os riscos e vulnerabilidades associadas. A manutenção destas estradas é
financiada pelo OGE. Menos desgaste nestas vias mais frágeis, traduz-se numa
poupança que pode ser aplicada na manutenção das autoestradas, baixando a
fatura daquelas.
· Estímulo
à Economia – Embora continuando presente a ideia de que não há
gratuitidade de qualquer forma nesta matéria, haveria sim uma rentabilização e
aproveitamento total, que fará reduzir enormemente os custos globais de
utilização da rede viária. Toda a logística nacional teria um custo
completamente diferente, mais baixo e mais célere, o que tornaria a economia
muito mais competitiva, a circulação de bens e pessoas mais rápido e seguro,
com reflexo obrigatoriamente considerado para o custo dos bens, criação de
emprego, competitividade internacional.
Se houver coragem, e os interesses
privados não se sobrepuserem aos interesses públicos (porque a rede viária é um
bem público), propomos que deveriam:
·
Desativar todas as portagens, em todas as autoestradas
e pontes de Portugal, tornando-as de circulação livre.
·
Rescindir por interesse público todas as concessões.
Promover como medida compensatória (além de outras que sejam justas), a contratação
da manutenção destas vias, e das outras vias da rede nacional, enquanto
prestadoras de serviços, mas sempre coordenadas e dirigidas pelo controle de um
organismo do estado.
·
Lançar um imposto anual de utilização da rede viária
sobre as viaturas matriculadas em território nacional.
·
Criar um imposto de utilização das autoestradas pago
por dístico anual, para todas as viaturas estrangeiras que entrem em território
nacional e circulem nas autoestradas. As coimas deverão ser bastante elevadas
para desincentivar a prevaricação.
·
Efetuar em todo o território nacional, um controle
muito mais exaustivo do cumprimento do código da estrada, com coimas
pecuniárias mais elevadas para as transgressões mais graves, designadamente
velocidade, condução sobre o efeito de álcool e drogas, e manobras perigosas
que coloquem em risco direto a vida de pessoas. Generalizar para este controle,
o recurso às tecnologias instaladas na rede viária, e incrementa-las. Esta
medida, adicionada à redução do tráfego nas estradas locais e regionais (mais
vulneráveis), por via do aumento do tráfego nas autoestradas (mais seguras),
permite prever uma grande redução da sinistralidade em Portugal, com a
consequente redução (espera-se que muito significativa) da fatura da saúde, dos
prémios e indemnizações das seguradoras, e custos sociais de ausência ao
trabalho, de fragilidades sociais e familiares que a paragem temporária,
definitiva ou morte de milhares de cidadãos ao ano acarreta e onera à
sociedade, às empresas e ao estado.
Luís Matias (arrimal@hotmail.com)
Julho de 2012
Sem comentários:
Enviar um comentário