Os Cogumelos e a Crise

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OS COGUMELOS E A CRISE
As duas recentes comunicações ao país, pelo Sr. Primeiro Ministro e pelo Sr. Ministro das Finanças, só têm a ver com o futebol, pela coincidência de serem proferidas uns minutos antes de jogos da nossa Seleção.
Terão muito mais a ver com os cogumelos: Uns são deliciosamente bons, outros são alucinogénios e outros matam mesmo. A dificuldade está em conhece-los. Dispararam imediatamente um turbilhão de comentários, em tantas direções que até os pontos cardeais devem estar enrascados para aplicar ciência a tanta direção. Mas verdadeiramente o que aconteceu foi um soco no estômago… e logo outro… e já estamos encolhidos à espera do próximo, numa impotência de quase moribundos.
Mas o mundo não acabou. Talvez não acabe nos próximos cem mil milhões de anos. Estes números astronómicos (se lhe tirarmos “anos”), soam como a dívida. Nem conseguimos imaginar. Temos compreensão curta. Por isso não imaginamos também as soluções. Assim, provavelmente… nem podemos imaginar, e teremos de desconfiar que muito do que ouvimos nas comunicações não será solução.
Mesmo assim, e voltando aos cogumelos, ainda há quem defenda e ache que as medidas anunciadas são comestíveis, são a única saída para a crise. Há quem pinte a crise de cor de rosa, tipo alucinogénia, e vá delirando com o benefício da dúvida… que isto não há-de ser tão mau como pintam…
Eu acho que estas medidas são fulminantes, matam mesmo em pouco tempo. Aliás gente avisada e sábia, mesmo do quadrante político do governo avisa, com ruido, que estes cogumelos matam. E só se morre uma vez. Para grandes males, grandes remédios, dirão outros.
E eu creio que haverá outros caminhos para sairmos deste aperto, que não seja a radicalidade da cura que mata ou da doença que definha até matar também. O problema é que quem manda, quem originou a crise não está interessado. Tem objetivos muito concretos e definidos, nada coincidentes com os do “povo”. Querem apenas dinheiro e poder: Poder vão busca-lo aos Estados que conseguiram enfraquecer, comprando-os com a dívida (dinheiro que emprestaram); dinheiro vão busca-lo ao lucro que conseguem com o abaixamento do preço do trabalho (única verdadeira fonte de riqueza), e que conseguem gerando primeiro o desemprego, compram tudo (inclusive bens públicos), e depois voltam a criar trabalho, mas a preços muito inferiores, utilizando o desespero doas populações. E volta-se a “novo ciclo económico”.
E os governos da Europa, incluindo o de Portugal, estão completamente vendidos, subjugados, subservientes a esta “corja” der exploradores do mundo, funcionando (voluntaria ou involuntariamente) como seus artífices, contra o povo.
A Europa do euro, neste momento, poderia resolver o problema da crise financeira dos países em dificuldades (que são praticamente todos embora alguns ainda não transpareçam). Apenas duas medidas seriam necessárias: uma imediata para resolver o problema, e outra sequente para garantir que a situação a que chegaram os países, não se voltaria a repetir. Bastaria ter coragem para desvalorizar o Euro, colocando-o em paridade com o Dólar americano, e emitir moeda pelo montante da desvalorização. Com essa moeda pagaria as dívidas dos países deficitários. Na segunda medida teria de estruturar-se com regulamentação adequada para uma vigilância efetiva e poderosa sobre as finanças dos países. Claro que isso representaria uma perda parcial de soberania. Talvez o modelo mais eficaz e compreensivo seja mesmo o passo para o federalismo.  Poderiam sair do Euro grupo alguns países? Claro que sim, mas e porque não? Há países (provavelmente Portugal é um deles) que estariam muito melhor fora do Euro, do que estarem a regular-se por medidas ditadas por potências, com as quais não podemos competir.
E Portugal poderia resolver de imediato o problema do desemprego, e melhorar a economia. Repartir o emprego que existe entre todos, seria um ato solidário e de cidadania. Temporariamente (e acredito que por pouco tempo), repartir o trabalho e a respetiva remuneração por todos, estimularia a economia e poderia ser o grande degrau de saída para ultrapassar a crise, não como os senhores do dinheiro querem, mas como nós queremos. Eles querem baixar o custo do trabalho, mas nós não baixaríamos o custo do trabalho, antes, repartíamos o trabalho por todos.
No nosso caso, seria até bem simples de fazer as contas: somos cerca de 5 milhões de trabalhadores no ativo, e cerca de 800.000 desempregados (vamos considerar 1 milhão). Quer dizer que se generalizássemos a semana de 4 dias (como medida de emergência), Todos passávamos a trabalhar menos 1/5 (20%), e teríamos a respetiva redução na remuneração, e as entidades patronais admitiriam (ou manteriam como alternativa ao despedimento), sem qualquer prejuízo, um trabalhador por cada 5 que reduzem o horário. Números redondos, dariam pleno emprego ao país, nestas condições.
O que ganharíamos? O Estado deixaria de pagar subsídios de desemprego; toda a gente teria um pouco menos de dinheiro, mas todos teriam, portanto a economia continuaria a funcionar; o ritmo de falências abranda ou estanca, permitindo ao Estado cobrar impostos (aos trabalhadores e às empresas); O tempo de ociosidade forçada aos trabalhadores, permitiria a dedicação complementar a outras pequenas atividades que, no seu conjunto, teriam um impacto positivo na economia, e algumas pequenas empresas haveriam de nascer daí, com criação de empregos e tributação de impostos.
As famílias mais carenciadas, afetadas pela medida poderiam ser ajudadas com verbas que antes eram gastas em subsídios de desemprego.
Esta medida não é inédita, porque já foi regulamentada em Portugal no sector público (semana dos 4 dias), e foi utilizada pela Alemanha (na unificação, aí com carácter voluntário), e idêntico princípio em algumas empresas portuguesas (Auto Europa e recentemente pelo INA - Instituto Nun’Alvares).
Desta forma, o preço do trabalho não reduziria (apenas a quantidade), e com a economia a crescer, dentro em breve e de forma automática, a situação da carga horária seria ajustada de novo a níveis convencionais, com benefício para as empresas em crescimento que utilizariam horas normais antes de utilizarem extraordinárias (mais caras).
Estou em crer que soluções deste tipo (admitindo que não sejam consensuais), não poderão nunca ser utilizadas por governos que podem estar ao serviço de outros interesses, designadamente apostados, não em resolver os problemas das pessoas, mas em voltar a concentrar o dinheiro nos poderosos, que só o conseguirão à custa do trabalho generalizadamente mais barato.
Talvez valha a pena lembrar que, obrigar a comer cogumelos venenosos a quem os apanha, acaba por não ter quem apanhe os que são comestíveis. Como quem diz, pode “virar-se o feitiço contra o feiticeiro”. A história já mostrou vezes de mais que, pisar o risco, pode levar a uma nova ordem social, depois de muita dor. Lembra-me a velha metáfora do Zeca «Os Eunucos devoram-se a si mesmos»!!!

Luís Matias
(Setembro 2012)

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